quinta-feira, 10 de maio de 2007

CIÊNCIA & Cª

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COM 7 LETRINHAS APENAS SE ESCREVE A PALAVRA CIÊNCIA

Meu Caro Miguel B. Araújo: Fiquei surpreendido mas muito honrado e satisfeito com as palavras, o tempo e atenção que quis dedicar à prosa aqui publicada sobre eco-previsões.
Tentando corresponder à gentileza e sem ocupar muito do seu precioso tempo, vou tentar ser breve e recolher o essencial da questão em causa – ciência & Cª – lamentando não poder entrar nos detalhes técnicos que evidentemente me escapam e tentando não fulanizar demasiado o que são referências pessoais que me dirigiu.
Aliás são bons conselhos que só tenho pena não poder cumprir, a idade pesa e já não é possível mudar de ideias todos os dias. Além de que nunca seria possível submeter-me às conveniências do establishment académico: tirei, a custo, o 5º ano dos liceus e o único diploma que tenho é de professor do ensino primário elementar (o tal «arrepiante basismo» que o Miguel detectou com rara argúcia).
Mas vamos dividir a dificuldade em partes, como aconselhava o Descartes:
1. Há desde já um ponto em que podemos estar de acordo: a palavra ciência, tal como a palavra CO2 e a palavra literatura para o surrealista André Breton - «mène a tout». Principalmente leva a uma conversa de surdos e não há volta a dar-lhe. O que se compreende e se torna bastante perceptível em várias ocorrências desta lista. A palavra ciência já vem armadilhada da fábrica. E há sempre um rótulo disponível para castigar o atrevido: «basismo», «obscurantismo», «esoterismo», «subjectivismo», etc.
2. Ao leigo que queira questionar a ciência, contestar, criticar ou mesmo filosofar um pouco sobre o conceito, ou simplesmente formular algumas dúvidas e perguntas, é impossível fazê-lo. Porque cada ciência muniu-se da sua própria sofística e entrincheira-se na nomenclatura especializada inacessível não só ao leigo mas mesmo aos especialistas das outras especialidades, que às vezes nem entre si se entendem, como é o caso – ouvi dizer – dos cientistas quânticos. Dividida e sub-dividida em especialidades, se alguém a quiser questionar é desde logo arrumado no rótulo de ignorante, basista, obscurantista ou esoterista, e posto no olho da rua. Por isso não há epistemologia, nem filosofia ou crítica da ciência (o que costuma aparecer com esses nomes): à partida a instituição dita científica impede, inibe, proíbe qualquer ideia de ordem geral ou quaisquer outros valores diferentes daqueles pelos quais se rege. É uma religião em que ao dogma se chama teoria.
3. Passando à parte fulanizante da sua mensagem e tentando não fulanizar demasiado, posso dizer-lhe uma coisa: acertou em todas as críticas que faz ao texto aqui publicado. Só não é inteiramente verdade que a minha aversão à sofística da ciência moderna (mein kampf, como dizia o outro) seja de agora, dos meus decadentes 74 anos. Posso garantir-lhe que a minha aversão ao discurso neo-sofístico (à conta da ciência em geral ou de alguma em particular) vem de muito longe, provavelmente desde que nasci: questão genética, sem dúvida. Ou questão kármica, quem sabe? Talvez tenha sido, em anterior reencarnação, um dos inventores da bomba atómica. Ou um dos culpados do iluminismo, do positivismo, da manipulação genética, da virologia ou outro dos múltiplos horrores em que a ideologia da ciência moderna é fértil. Ideologia ou religião que levam ao marketing, capaz de corromper tudo e todos, até os mais impolutos.
4. Mas agora reparo: também não posso considerar-me um bárbaro a investir raivosamente contra a cidadela científica. Entre os cientistas que pensam e filosofam sobre o alcance da própria ciência que criaram, e às vezes com todo o Rigor que o Establishment exige, tenho uma boa lista de nomes que leio, estimo e admiro. Alguns estão arrumados na estante «ciências do maravilhoso», ao lado das 12 ciências sagradas dos hierofantes egípcios. Não faço discriminação racial. Dentro dos meus limitados recursos mentais, - dentro do meu basismo - vou-me esforçando por atender a todos, pois esta pista do maravilhoso já a descobri um bocado tarde, em 1992, quando li «L’Alchimie de la Vie». Apesar de tudo, acho que não sou ainda um caso perdido nem ando a derrubar por gosto os ídolos dos outros e só porque tenho os meus. Infelizmente, a manipulação mediática é que não nos dá um minuto de descanso com os «idola tribu»: quando não é CO2 é virologia, quando não é virologia é CO2, e sinceramente não há pachorra e um homem não é de ferro.
5. Aliás a história da ciência, vista em perspectiva e de maneira selectiva, tem episódios maravilhosos, tal como outras criações humanas. As modernas perversões - cartesianismo, iluminismo, positivismo, virologia, manipulação genética, aquecimento global e outras tretas que a ciência oficial pratica ou autoriza - , é que sinceramente não têm nada de maravilhoso e são uma boa parte do pesadelo deste tempo-e-mundo. Mas como a manipulação mediática se alimenta de perversões, é evidente que só explora essa parte, pelo que todos os dias somos confrontados com ela. Vamos conformar-nos?
6. Uma boa triagem, hoje, entre a ciência que importa e a ciência que não interessa nem ao Menino Jesus, talvez fosse um bom contributo ao progresso humano do Planeta Terra. Mas não me compete a mim tamanha tarefa.
7. Um ponto mais pessoal: acertou em cheio na muge quando diz que uso e abuso da Retórica. É a única arma de que, como ignorante e basista, disponho para atacar o que odeio e defender o que amo. É a especialidade de quem não tem nenhuma especialidade. Se me tiram a Retórica é que fico mesmo desguarnecido e entregue aos bichos. Se o Miguel, o Carlos Aguiar ou o Pedro Martins Barata (os que tiveram a gentileza de me dar atenção) me tiram a Retórica, aí sim, fico arrumado. Mas acho que nenhum seria capaz de uma tal desumanidade.
8. Agora um ponto ainda mais pessoal: agradeço a sua preocupação com a minha decadência, como é que – diz você - «tão ilustre jornalista da causa ambiental (terá) resolvido coroar a sua carreira com um esforço obsessivo de ataque à ciência e aos que dedicam a vida a ela?» (!!!). É o único ponto em que não acertou em cheio: isto não é de agora, da velhice, é de sempre, é genético e como para a biologia oficial só existe um código – o da fatalidade – nada a fazer para salvar a criatura. Depois não houve nunca «ilustre jornalista da causa ambiental» nem «carreira a coroar» (cruzes, canhoto). Acidentalmente e para curar o tédio crónico de estar entre tanta gente ilustre, apenas fui dizendo e publicando o que pensava, sempre que as censuras me deixavam, antes e depois do 25 de Abril. Agradeço a sua preocupação com o meu estado mental mas não deve ser grave. Se a biologia não explicar, ainda tenho outras escolhas: pode ser um caso de divã (psicanálise) ou, em último caso, de psiquiatria (internamento compulsivo). Não se preocupe, portanto, Miguel, há-de haver um fim glorioso (e científico) para a criatura.
9. Ao contrário do que possa pensar, admiro o seu trabalho como gestor deste forum de discussão que é a Ambio. E pelos motivos que indiquei: a conversa entre especialistas e leigos será sempre um diálogo de surdos e não sei se valerá a pena insistir. Por mim, se for aconselhado a sair, pode crer que o farei: afinal não tenho qualquer objectivo pedagógico, salvífico ou sequer militante com as prosas que envio. Nem sequer quero contribuir para a confusão e para combater o CO2. É só para me divertir um bocadinho e um ou outro leitor que, como eu, não se leve muito a sério nem leve muito a sério o meio ambiente que nos rodeia. Este tempo-e-mundo onde a manipulação mediática todos os dias se socorre da manipulação genética e outras proezas dos laboratórios científicos. Além da Retórica, só uma risada às vezes nos salva de adormecer em pé.
10. A terminar estes dez mandamentos, um provérbio árabe muito pouco conhecido no Ocidente cristão: «Com 7 letrinhas apenas se escreve a palavra ciência, que é das palavras pequenas a maior que o mundo tem.»

Cumprimentos,
Afonso Cautela

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