sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

HÁ JÁ 39 ANOS

1-9-consciência ecológica> terça-feira, 30 de Abril de 2002: fiz uma primeira revisão superficial mas tenho de encontrar o original de onde foi scanado para uma revisão mais apurada

O DESPERTAR DA CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA(*)

(*) Um artigo de Afonso Cautela, publicado na revista «Linda», entre 1980 e 1982 (?)

Dizer que o Movimento Ecologista preconiza uma «educação dialéctica» será, para a maior parte dos pais e professores, uma expressão demasiado vaga e abstracta. Iremos tentar concretizar com alguns exemplos que têm em comum, exactamente, a transição gradual de um sistema dogmático para um sistema aberto, dialogante, onde a dialéctica não seja mais uma teoria ou uma matéria curricular mas o espírito que preside a todas as actividades escolares ou circum-escolares. Mais do que uma disciplina, ou capitulo de uma disciplina, a Ecologia será nova óptica de ver o mundo, uma nova maneira de viver e portanto, uma nova maneira de aprender.

O QUE PODE FAZER O EDUCADOR

Entre a vida e a morte

O que está em causa numa escola prospectiva que trabalhe no sentido de substituir por outra - menos violenta e humana - a sociedade que temos, é a gradual substituição dos valores que, transformados em mitos, se tornaram princípios imutáveis do comportamento individual e colectivo. Se continuarem inspiradas nesses mitos, nesses valores, nessa axiologia ou nessa moral, as novas gerações vão consecutivamente reforçando as estruturas de uma sociedade estabelecida em vez de, paralelamente a essa, fundarem as raízes para uma sociedade habitável. A história contemporânea vive num momento de pré-rotura, que muitos profetas corta Ivan Illich, Edgar Morin, Rogar Garaudy, Khrisnamurti, Michio Kushi e tantos outros não se têm cansado de diagnosticar, indicando as portas de saída para esse «apocalipse»: trata-se, portanto, com a ajuda desses Mestres, verdadeiros guias do Mundo Contemporâneo, preparar as novas gerações numa fé e num conjunto de valores bastante diferentes dos que são actualmente adorados na sociedade industrial.
Para que a rotura se não dê violentamente, só a educação pode garantir a Mudança sem traumatismos de maior. Pela educação vamos tentar Mudar de Sociedade, antes que o Planeta morra. Os minutos estão contados. É uma corrida contra relógio entre a Vida e a Morte. Entre a Ecologia e a Catástrofe.

Da violência Olímpica à dialética Zen

De quatro em quatro anos, as Olimpíadas reforçam, à escala planetária, os valores sobre os quais se edificou esta «civilização», metas a atingir, competição a disputar, vencer o adversário, ganhar medalhas, ser o melhor do mundo, etc., etc., assistimos a uma vaga de poluição ou mitologia das mais poderosas do nosso tempo. Tabu intocável, ninguém critica. Tacitamente, todos aceitam. E respeitam.
Mas esta poluição é tanto mais perigosa quanto se pretende dar como inócua ou não influente nos campos (sérios) da política. Os jogos olímpicos seriam o campo lúdico-gratuito, platónico, que nada teria a ver com a violência verificada no dia a dia histórico. Quanto muito, as competições olímpicas serviriam de gigantesca válvula de escape à violência armamentista e nuclear acumulada em mais quatro anos de zelo militarista. Seria ainda uma espécie de bode expiatório para canalizar a «natural violência do homem »
Sem ser necessário proceder à psicanálise profunda do fenómeno olímpico, e quer o acertemos ou não como mecanismo exemplar que reproduz os mecanismos de opressão/repressão das sociedades industrializadas, basta que o professor anote para sua reflexão mais esta mitologia e o seu papel educativo ou deseducativo. É uma opção filosófica. Está em jogo, afinal, uma opção ocidental de raiz greco-latina ou, pelo contrário, uma concepção dialéctica de raiz não violenta, da qual es artes marciais são hoje a prática mais conhecida no Ocidente.
Karate-io, ju-do, jíu-jutsi, yoga, qualquer destas práticas arrasta consigo uma filosofia (moral) incompatível com a que rege a competição olímpica. São facto dois mundos que se põem à nossa opção.
Estamos à disposição dos professores interessados em reunir textos de apoio que aprofundem esta bifurcação fundamental numa pedagogia ecológica que se inquieta de facto com o futuro do Planeta e, portanto, das novas gerações: olimpíadas ou artes marciais?

ECOLOGIA DA DESCOLONIZAÇÃO CULTURAL

Não estou a sugerir ao professor que proíba as suas crianças de fazer ginástica sueca e que mande o pessoal todo para o ginásio de judocas...
Entendamo-nos. As práticas são importantes, mas é mais importante o espírito com que se pratiquem. Numa perspectiva dialéctica ou ecológica da Pedagogia, não são as técnicas o principal mas o espírito que as anima. E a escolha de fazer ginástica sueca ou yoga tibetano - ou até ambas as coisas e mais marcha a pé!... - deverá caber, em última instância, ao educando mais ou menos desperto, já, para o mundo que amanhece.
Importante para o professor consciente da sua missão educativa (e não só didáctica, transmissora de conhecimentos) é não bloquear o possível despertar da criança, e é fazer compreender ao educando que é toda uma hierarquia de valores que se altera ao comparar as artes marciais à competição.
Ao eleger as «artes marciais» como «filosofia de vida», verifica-se uma mudança espectacular na escala de valores de muitos outros campos: a energia vital ou bioenergia, por exemplo, passa a ter lugar prioritário, a ela se submetendo as outras fontes de energia que, embora menos nobres, continuam a ter no entanto a prioridade na escola de valores - materialistas...- do mundo ocidental.
Termo-eléctrica ou hidro-eléctrica, fóssil (petróleo e carvão) eletro-nuclear (urânio e plutónio), as energias que preocupam o ocidental e fazem correr técnicos, engenheiros, políticos, economistas, nunca são as energias do Homem.
Ora, segundo a mais antiga tradição, a energia somos Nós. Vem o yoga e coloca no topo a «energia Ki», como dirá um mestre japonês. Vem o Tao e o Zen, e privilegiam o corpo humano, receptáculo de potencialidades infinitas, gerador de energias limpas, infinitas e subtis. h maior potência, a pilha por excelência, somos nós. Mas adormecida. Educar é despertar a grande energia que somos.

A ARTE E A SIMPLICIDADE

«Uma pedra natural foi talhada durante milhões de anos pelo calor, o frio, as intempéries e todas as forças universais.
«Depois um escultor começa a trabalhá-la com os seus instrumentos. A fim de transformar esta rocha em qualquer coisa tão boa ou melhor que o seu estado original, o escultor deve ter um discernimento muito elevado.
«Lao-Tsé diz que «não agir é o que há de melhor», porque se nós pegamos em qualquer coisa já perfeita e lhe tocamos, aqui e ali, nós a estragaremos.
«A simplicidade é sempre melhor que a riqueza em arte, ou na vida, que nós podemos tratar também como uma arte, porque ela exprime o Infinito de uma maneira muito clara. «Todas as artes têm seu meio de atingir o nível mais alto: no arranjo de flores, é o espaço; na cerimónia do chá, é o silêncio e o não agir, de maneira que o som e o movimento sejam minimizados; nas artes marciais é o não agir. «Considera-se o Karate-Do como a mais baixa destas artes porque ele utiliza força de uma maneira aberta; em seguida vem o judo, o Aikido e o T'Ai Ki Tch'uan são os mais elevados porque o emprego da força é reduzido ao mínimo; seus próprios movimentos são mais leves e suaves como o próprio Universo.
«A arte marcial mais. elevada é o não-agir aperfeiçoado ou a unidade com o adversário.»
«Na arte de visitar nós devíamos ser igualmente simples, o mais simples possível, utilizando o mínimo de adornos. «Homens religiosos têm roupas especiais que vestem para rezar ou meditar. Esses adornos são em «algodão» ou «juta. com tinturas vegetais que permitem uma maior receptividade das vibrações elevadas. Esta qualidade vegetal faz muita diferença. É por isso que deveríamos evitar as roupas de origem animal ou pelo menos vestir roupas internas de algodão. É muito difícil curar pessoas doentes, se elas vestem roupas de lã ou têm coberturas de lã. Se faz muito frio e se a lã é necessária para se ter calor, as roupas interiores deviam ser de algodão».
MICHIO KUSHI, in «Ordem do Universo», N.º 5

NEM SÓ PARA O TRABALHO NASCE O HOMEM

Sejam pais ou professores, isto é uma ..revolução- nos esquemas habituais do nosso pensamento.
Para salvar o Planeta, porém, a Humanidade e a Nova Geração, teremos de operar na nossa mentalidade estas e outras mudanças ainda mais radicais. Mais inesperadas.
Para facilitar a mudança sublinhe-se que esta súbita valorização neo-taoísta da energia humana encaixa genialmente nas teorias europeias da alienação, em filósofos como o Karl Marx da juventude... Homem alienado é aquele que o capitalismo destituiu das suas próprias e poderosas energias.
A Bioenergia e seu desenvolvimento por toda uma prática coerente toma-se assim uma reivindicação revolucionária... apesar de pacífica.
Daí que não deve admirar-nos a barragem de silêncio e censura que os sistemas fundados na alienação humana' (todos os que advogam a exploração do trabalho humano) fazem relativamente ã informação ecológica das práticas dialécticas libertadoras. Como num opúsculo editado em 1977, ajudando à recolonização mental dos povos, à sua sistemática alienação e opressão cultural, as grandes cadeias de informação vão servindo seu rei e senhor: o imperialismo.» E nesse ensaio escrevia ainda:
«Quando adregam de nos informar sobre acupunctura, zen, yoga, taoísmo, princípio único, massagem shiatsu, yin-yang, cosmologia extremo-oriental, filosofias e medicinas orientais - as agências noticiosas primam pelo «exotismo», peio racismo europocêntrico, pelo incurável colonialismo congénito».
(In «O Tao e o Zen Vistos por um Ecomilitante», Ed. «Frente Ecológica», 1977).

ECOLOGIA ALIMENTAR

A pressão sobre o sector da produção agrícola pode ser exercida a vários níveis: nas escolas onde se ensina, nos livros que se divulgam, nos programas televisivos ou radiofónicos. Em qualquer dos casos, a informação agrícola para o público é quase sempre, explícita ou implicitamente, patrocinada pelas companhias de produtos químicos.
Contra esta opressão quase totalitária sobre a opinião pública, só há uma alternativa ou saída: multiplicar uma prática alimentar que exija produtos de uma agricultura diferente, guiada por princípios ecológicos e biológicos.
As correntes que defendem uma alimentação mais racional vão indirectamente, através do mercado, influir no estilo de produção, que desenvolverá então sectores alternativos de produção biológica de alimentos.
Entre estas correntes, a Macrobiótica ganhou um número de adeptos significativo: demonstra esse número que a MB funciona, como alimento e como terapêutica.
Mas a MB é ainda uma autêntica Economia Energética. Quer dizer: para lá de uma opção higiénica (rejeitando porcarias químicas e outras no que as pessoas comem) ou de um recurso trofo-terapêutico, a MB centra os seus consumos essenciais em meia dúzia de produtos, um dos quais - as algas - nem seria preciso cultivar, basta colhê-lo.
Arroz, algas e soja constituem a «Santíssima trindade, desta Ecologia Alimentar que dispensa produtos cárneos e que, por isso, numa perspectiva global da Economia se poderá dizer que economiza proteína. Mas nem só.
Para os que continuam a referir a Macrobiótica como uma moda «hippy» ou uma dieta leve para idosos e anémicos, há que dizer uma coisa: face à fome mundial e à escalada na destruição dos recursos alimentares, a Macrobiótica apresenta desde já a única alternativa prática imediata de sobrevivência, para os que sofrem hoje fome e para todos os que também hão de vir a sofrê-la não tarda muito tempo. O máximo de energia vital com o mínimo de alimentos.
De facto, nada tem a ver esta Economia Energética, esta dialéctica yin-yang aplicada ã alimentação, com as muitas correntes ditas vegetarianas ou de alimentação racional, quase todas de um moralismo insuportável.
A Macrobiótica é apenas a aplicação ao campo alimentar de uma ética que noutros campos deu as artes marciais, a acupunctura, o hatha yoga, a massagem shiatsu, a meditação, os mantras, etc., ele..
É tal a abundância de bibliografia em língua portuguesa - principalmente traduções de Michio Kushi - que me limito a remeter o leitor para a rubrica Alimentação das Páginas Amarelas, onde figuram os vários centros dietéticos e alimentares onde podem informar-se praticando e praticar informando-se. Pela nossa parte, estamos também à disposição para qualquer esclarecimento suplementar neste campo polémico mas de vanguarda que é sem dúvida o yoga alimentar.
Raízes para a função de um Mundo Novo.

AFORISMOS DA MORAL ENERGÉTICA:

«Tudo se paga. - Todo o efeito tem uma causa e vice-versa».

«Para cada acção, há uma reacção igual e oposta» (Terceira Lei de Newton)».

«A Terra não é nossa, foi-nos emprestada pelos nossos netos».

«A Natureza tem alma, nós é que não a vemos».

«Ocupados a ganhar a vida, esquecemo-nos de viver».

«Saúde, silêncio e segurança: os três da sobrevivência».

«Não somos nós que protegemos a Natureza, mas a Natureza é que nos protege».

«.Mais de duzentos aditivos químicos estão oficialmente autorizados na nossa alimentação actual».

«Ver hoje o Mundo com olhos de Amanha».

«Não são os olhos que permitem ao homem ver, mas e o homem que permite aos olhos que vejam».

ECOLOGIA AGRÍCOLA

O professor deverá mostrar às crianças a importância do sector primário na vida económica. A imagem secundária que a sociedade tecnológica tem dado da agricultura pretendeu afinal inculcar uma hierarquia de valores que levasse à depreciação da vida e da terra face à fabricação de manufacturas.
Sem comer, não vivemos. É a partir desta necessidade real que gira toda a História Humana, facto que a sociedade tecnológica e industrial tem fingido esquecer. Há que desfazer nas novas gerações a ilusão (perigosa e trágica) de que chegará o momento em que poderemos dispensar totalmente a terra, a agricultura e os alimentos naturais. Será tudo sintético e de plástico - vai insinuando a propaganda industrial de todos os tipos, a tal ponto que as novas gerações, totalmente desligadas da realidade natural, começam a ficar subconscientemente convencidas de que o auge do progresso e mesmo 0 paraíso sem problemas será, daqui a paio, quando tudo for manufacturado e pudermos dispensar a vida que cresce nos campos cultivados. O ideal para alguns será fazer de Portugal uma fábrica fumegante, ganhando com isso 0 dinheiro que nos permita depois comprar... cereais ao Estrangeiro. Também aqui impera uma ..mitologia» de aparência progressista alimentada por poderosos interesses que não hesitam em hipotecar a Natureza à sua ganância.
Dar prioridade à vida e à actividade agrícola, colocar a produção de alimentos entre as profissões mais necessárias e dignas, dotar de meios as regiões para que a população rural se possa fixar á terra em vez de a abandonar, tudo isto corresponde a uma Ética de base ecológica que o professor, face ã ideologia dominante, terá a maior dificuldade em fazer prevalecer.
Para isso terá de começar por combater em si mesmo certas ideias feitas, preconceitos e lugares comuns que se têm imposto, aliás, com inaudita violência, que avassalam a opinião e que tendem, no conjunto, para denegrir a actividade agrícola, pintando-a sempre nas suas cores arcaicas de atraso e envelhecimento; por outro lado, como termo de contraste, elogia-se uma agricultura de escala industrial, organizada em monopólios, monoculturas extensivas, mecanização, derrube sistemático, arado mecânico, adubos químicos, doses crescentes de pesticidas, etc.
Nenhuma destas imagens, no entanto, tem futuro: e a última menos ainda do que a primeira, já que conduzirá á ruína ecológica dos solos, aos desequilíbrios nos ecossistemas, á desertificação, a alterações drásticas do ciclo hídrico e do clima. a chuvas torrenciais por um lado e secas castastróficas por outro.
Mais do que a Ecologia; manda o bom senso que se preparem as novas gerações no sentido de abrir uma fase de transição que permita recompor os ecossistemas e refazer a fertilidade dos solos quando chegar a altura da grande fome e do grande regresso em massa á tema dos esfomeados das cidades.
A ideologia dominante nas escolas agrárias é totalmente servil aos interesses internacionais da agroquímica, altamente lesiva do interesse e da realidade nacional. Há que ter coragem para enfrentar esta campanha de intoxicação. Mas resistir e fazer contra-vapor a este mercenarismo que já nem é subtil, é a única maneira de fazer Pedagogia honesta.
Em matérias de Ecologia agrícola, a opção do professor torna-se um acto de heroísmo cívico. Mas é isso que se espera dos verdadeiros mestres: que transmitam a verdade, custe o que custar e doa a quem doer. Verdadeiro manifesto da verdade ecológica na agricultura é um estudo do Prof. Gomes Guerreiro, editado em 1978, pela Direcção Geral de Extensão Rural, chamado «Importância do Sector Primário no Plano a Longo Prazo», Para ler, reler e seguir.

A DIALÉCTICA CIDADE-CAMPO

Entre as mitologias mais difíceis de extirpar, o professa encontra pela frente os mitos citadinos da concentração urbana.
Portugal é Lisboa e o resto é paisagem - traduz, enquanto aforismo, essa mitologia.
Durante mais de um século, a emigração para a cidade tornou-se uma ..corrente irresistível.. e o despovoamento dos campos quase um título de honra ou de glória. Tudo, menos ficar na terra,
O futuro demográfico na cidade concentracionária no campo e na aldeia. E o que eram ali as condições de inabitabilidade foram largamente exploradas para que, em contraste, o «conforto» da grande cidade ficasse no topo dos valores a perseguir.
Problema melindroso, ainda hoje, em que os poderes e desconfortos da cidade já estão largamente denunciados. Deve o professor situar-se na zona difícil da transição em que hoje se encontra o dilema cidade-campo.
De facto, a corrente migratória no sentido do Campo para a Cidade começou a sgfrer obstáculos que a entravam. O desemprego, a proletarização crescente dás cidades industriais, o congestionamento, a dificuldade de alojamento, os bairros degradados da periferia, o incremento do ruído e das poluições, tudo isto já não permite manter intocável o mito de que a cidade é qualidade de vida e o campo a morte lenta.

Claro que a vida no campo foi abandonada dos poderes centrais que a deixaram degradar-se exactamente para pressionar o êxodo dos trabalhadores e o afluxo de mão-de-obra dócil aos concentracionários fabris. Mas neste momento é o próprio sistema industrial que se vê a braços com o excesso de mão-de-obra, e os desempregados aumentam nas cinturas desses centros: e a maior parte tem a retirada ou regresso à terra cortada.

Campanhas de europeização e promessas (falsas) de novos postos de trabalho não podem omitir a tendência de fundo, hoje, para a fixação á terra dos que podem a ela regressar ou dela não sair. Têm-no tentado citadinos saturados dos enganos e enredos da «civilização.. urbana mas é necessário, cada vez mais, que os jovens da província, logo na escola, saibam quanto ganham na mecânica e alienada substituição das raízes pelas mentiras do «progresso».
Como dizia o semanário «Brados do Alentejo» (14.8.80), numa aguda observação do fenómeno, filho de pastor não mais quer ser pastor. Seu pai começou por comprar um transistor. A bicicleta foi promovida a motorizada. A escolaridade aumentou, incluindo as mulheres. As calças de cotim ou saragoça foram substituídas por blusão e «blue jeans».
Filho de trabalhador rural procurou uma ocupação na vila ou cidade mais próxima. Rurais ainda assim. Empregado de café, caixeiro, ajudante, mecânico ou amanuense «enrola a charrua em papel de seda», perde o assobio, esquece o cajado, a fisga e o nome das coisas e «renta-se no campo». Troca a taberna pelo café com televisão. Deixa crescer os cabelos e nos bailes aldeãos dos anos 60 é o John Travolta precoce, para escândalo das mães sonâmbulas que guardam as filhas até madrugada.
«O antagonismo campo-cidade tende a diluir-se».

ECOLOGIA DO PATRIMÓNIO, CONTRA A MITOLOGIA DA DESTRUIÇÃO

O recente incremento verificado na defesa do Património cultural já chegou às escolas, não só através de um concurso da Direcção Geral do Património, em que se convidavam as crianças a inventariar realizações locais mais interessantes, mas através de cartazes e teleprogramas que puseram na ordem do dia o Património cultural e sua defesa.
Mais de 100 associações se formaram por todo o País, reivindicando total independência do poder central e local. Recebendo embora apoio da Secretaria de Estado da Cultura, é para a formação de cooperativas 'e associações de base que este movimento em defesa do artesanato, da etnografia, da arqueologia, da arquitectura rural, das indústrias arcaicas, das tecnologias de aldeia se orienta. De tal maneira avassalador, o movimento já não tem que ser procurado pelos professores porque invadiu escolas, cidades, vilas e aldeias de Portugal.
O professor terá só que selectivar, em função de uma pedagogia ecológica, as prioridades, procurando englobar na prática escolar mais o espírito do que a letra da campanha. Olhar com atenção o Mundo e a Vida - é o primeiro sinal de amor pelo património. Ensinar a olhar (quer dizer, a amar) será função do professor, que só terá depois que ensinar a ver também o contraponto dialéctico da conservação e preservação patrimonial: saber afinal quem destruiu e destroi o que só agora vemos digno de ser protegido e amado.
A sociedade das megatecnologias e das energias hiperpoluentes conduz à destruição não só da Natureza mas do Património construído, das tradições, do homem, da cultura, das raízes e portanto do futuro.
Ver isto é inevitavelmente substituir uma escala de valores que até agora se tem imposto pela força. Ver isto é optar por uma sociedade e por um modelo de desenvolvimento económico. Assim terá o professor que o compreender para o transmitir aos alunos na prática quotidiana. Reconverter os conceitos vigentes de Progresso é trabalho de reciclagem mental para o professor. Porque - não o esqueçamos- foi em nome do Progresso que se destruiu, e ainda se destroi, apesar das campanhas em prol do Património, grande parte do tesouro cultural que as velhas gerações transmitiram ás gerações do futuro. Garantir esse fluxo, agora em colapso, é o que se pede ao educador.

COOPERATIVISMO E MORAL ENERGÉTICA

Por estranho que pareça, ainda não existe uma cadeira de Cooperativismo nas Escolas de Magistério e onde quer que se preparem professores.
Terá o educador consciente que suprir essa lacuna, auto-informando-se por sua iniciativa sobre as bases de um movimento que, sem dúvida, conflui no grande rio das preocupações ecológicas de uma pedagogia auto-gestionária. O «self government» em que Antonio Sérgio tanto batalhou.
Com todos os riscos e erros de um movimento que o Poder raramente tolera ou ajuda, é isso exactamente que o torna um irmão privilegiado da convivialidade ecologista. De uma nova prática para educandos e educadores. Dir-se-á que pode haver cooperativas fazendo agricultura química assim como há cooperativas fazendo agricultura biológica, e que a ecologia não é condição sine qua non do cooperativismo.
Mas este a priori é mais aparente que real: a estrutura associativa do tipo cooperativo encaminhará, a médio e longo prazo, para soluções ecológicas a lógica das explorações, se nelas se mantiver a escala humana.
Todas as realizações de dimensão humana, como o cooperativismo, conduz tarde ou cedo a soluções ecológicas, e foi principalmente esta função «educativa,, das cooperativas o que atraiu para o movimento António Sérgio.
Basta o exemplo da Reciclagem de materiais e desperdícios. Só quando se procura o máximo de benefício no mínimo de desperdício, só quando não se toma o lucro em motor da economia a reciclagem resulta uma técnica ou solução ecológica.
Abra-se ao cooperativismo agrícola um campo infinito de potencialidades, por enquanto ignoradas, quanto ao Reaproveitanento metódico dos Desperdícios e Detritos orgânicos. A produção de biogás por excrementos de pocilgas e vacarias é um exemplo que se deverá divulgar até ao infinito. Mas dezenas de outros reaproveitamentos apontam para uma Economia de Escola Humana.
Atenção á Reciclagem, senha professor. Terá que se informar por sua conta, pois não é matéria que tenha entrado já nos manuais escolares ou à qual importe dar grande divulgação.
Pedagogia de vanguarda depende muito dos professores que se recusem ficar estagnados na retaguarda.
No Ministério da Agricultura e Pescas, que patrocinou o I Congresso Nacional dos Desperdícios, poderão os mais interessados procurar bibliografia. As organizações ecologistas pouco mais têm do que boa vontade. Também nesta matéria - Política e Pedagogia da Reciclagem Energética - nos pomos à disposição dos educadores para uma eventual troca de impressões.

ECOLOGIA ACÚSTICA

Problemas de civismo, por um lado e de policiamento por outro, o Ruído deve ser encarado não só como um incómodo ambiental mas como doença degenerativa do Planeta Terra.
Sintoma gritante de uma sociedade que efectivamente despreza o silêncio como condição e valor do espirito, a luta contra o Ruído torna-se, entre as elites intelectuais do País (a que os educadores pertencem) um símbolo de luta contra o que é ordinário, vil, desumano, sujo, inestético.
Contra o Ruído é a vida como estética, sensibilidade, nuance artística, ternura e emoção que se defende. Contra o escape roufenho de motorizada, é o direito a ouvir Chopin e Beethoven que se defende. Contra o bang energívoro da paranoia supersónica, é uma tecnologia de rosto humano que se defende. Contra a violência dos motores infernais, é a reconversão dos transportes públicos, o direito a um ambiente de trabalho saudável o que se defende.
No livro «A Indústria do Ruído, o Direito ao Silêncio» (Ed. Arcádia, Março de 1974) apontam-se os vários interesses económicos dos que ganham com a produção de Ruído que, a maior parte das vezes, não é um mal necessário ou uma fatalidade, mas metodicamente produzido como alienação que reforça as outras alienações.
Sirva o Ruído ao professor para sensibilizar e mobilizar as novas gerações numa luta cívica mas também para um limiar de sensibilidade um pouco acima dos cães.
Isto, claro, sem grandes ilusões que as coisas mudem, já que o ruído é intrínseco à exploração do homem pelo homem, à manipulação do homem cobaia do Homem.
É a este nível que o Ruído se torna um bom motivo para ir do civismo à consciência política do cidadão.■