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MILHÕES DE AMIGOS(*)
[(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «A Capital», «Leituras de Verão», 6-9-1990]
24/8/1990 - Depois que lhe foi atribuído, o ano passado, o Prémio Nobel da Paz, o 14º Dalai Lama, chefe político e religioso do Tibete (país ocupado, há quatro décadas, pela República Popular da China), tornou-se uma figura popular, vedeta dos «media» e um escritor conhecido.
Ainda que não estivesse inédito em livro, pois circulavam várias obras suas, em diversas línguas ocidentais, sobre doutrina e prática budista, só depois do Prémio Nobel essas obras passaram a ocupar lugar de relevo nos editores e escaparates de todo o Mundo.
Entre as editoras mais atentas aos «novos ventos da História», a Pensamento de São Paulo (Brasil) tem marcado pontos. Nada lhe escapa de importante e de essencial. Longe vai o tempo em que se considerava medíocre a edição brasileira. Hoje, em matéria de vanguarda, bate aos pontos as melhores editoras de Lisboa e Porto.
É assim que acaba de surgir, quase na mesma hora em que saiu em Nova Iorque a edição norte-americana, «Bondade, Amor e Compaixão»(*), discursos do Dalai Lama nos E.U.A., compilados por Jeffrey Hopkins e Elizabeth Napper. Onde quer que ia e fosse qual fosse o País que visitava (numa peregrinação que em alguns aspectos se assemelha à do Papa João Paulo II) ele conquistava milhões de amigos para si, para o seu povo mártir e para o «dharma» budista. Agora, com estes discursos de larga influência que pronunciou para vastas audiências e abertos a todos os credos, ele conquistará também o coração de milhares de leitores, falando uma linguagem que, de tão universal e intemporal, já quase se encontrava esquecida do mundo contemporâneo.
Com efeito, a mensagem de Sua Santidade Tenzin Gyatso - denominação que hierarquicamente lhe é devida na ordem iniciática a que pertence - , não se destina unicamente a crentes budistas mas a todas as pessoas que acreditam na possibilidade de transformação do homem como indivíduo e membro da sociedade. Entre outros assuntos, o chefe do povo tibetano no exílio fala sobre adestramento e transformação da mente através da meditação, sobra as divindades do budismo tibetano e sobre a arte de captar, além das aparências, a verdadeira natureza das pessoas e dos fenómenos.
O organizador e tradutor desta colectânea, Jeffrey Hopkins, é professor na Universidade de Virgínia, onde rege um curso de estudos budistas, tendo acompanhado o Dalai Lama em suas viagens pelos E.U.A., Sueste da Ásia e Austrália.
De leitura também interessante para o grande público é a obra « Minha Terra e Meu Povo»(**), testemunho sobre as vicissitudes do povo tibetano, em resistência contra o invasor chinês desde 1950.
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(*)«Bondade, Amor e Compaixão», Décimo Quarto Dalai Lama, Editora Pensamento, São Paulo
(**)«Minha terra e Meu Povo», Décimo Quarto Dalai Lama, Editora Palas Athena, São Paulo
(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «A Capital», «Leituras de Verão», 6-9-1990
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[publicado em «leituras de verão», eventualmente modificado] -
ROTINA DO MILAGRE NA MAGIA TIBETANA
[13/5/1992 ] - O que vulgarmente se classifica de «mágico», acontece, em sociedades ainda ligadas às origens do Mundo, como um fenómeno normal de rotina.
Esta podia ser uma das conclusões a retirar do livro «Místicos e Mágicos do Tibete», da escritora Alexandra David-Neel, nascida em França, livro que se encontra em edição portuguesa das Publicações Europa-América (*)
O olhar que esta autora lança sobre o mistério tibetano é de um jornalista ou de um investigador científico, habituado ao nível racional e factual dos acontecimentos e sem ir muito além da casca ou superfície dos fenómenos. Ainda assim e se tivermos em conta que o Tibete (e o lamaísmo) já foi vítima de um «gangster» chamado Lobsang Rampa, pelo menos Alexandra David-Neel é honesta e de boa fé, com o mínimo de abertura a um tipo de sensibilidade completamente diferente da maneira de ser ocidental e a um fundo secular de sabedoria que nada tem a ver com os padrões em vigor nas tradições europeias.
Ela deixou-se apaixonar pela cultura tibetana e, se é certo que não compreende muito daquilo que observou, também é verdade que o mostra sem preconceitos, sem classificar de charlatanismo, como tantos fazem, tudo aquilo que não está à altura de compreender. É como se tivesse sido chamada à missão de divulgar no Ocidente a mais antiga tradição primordial viva. A sua vida tem sinais muito claros dessa predestinação, que ela, aliás, aceita e assume com a maior naturalidade. Ela percebeu, pelo menos, que nada acontece por acaso e que também a sua vida estava traçada... Alexandra David-Neel trouxe, assim, desse mundo «desconhecido e proibido» uma fabulosa amostra do tesouro que se contém no cofre do conhecimento milenar e secreto, a sabedoria prática (mágica) contida nas ciências ditas ocultas.
Nascida em Paris em 24 de Outubro de 1868, de uma família francesa protestante, faz a primeira escapadela para a Grã Bretanha aos dezassete anos. Estuda filosofia e línguas orientais. Uma manhã resolve ir para o Tibete, onde se iniciará no budismo. Até à guerra 1914-18, vem à Europa algumas vezes mas por pouco tempo. Da China aos Andes, muitas vezes a pé e como peregrina, atravessa todo o Tibete e conta essa experiência no livro «Viagem de uma Parisiense a Lassa». Bloqueada na China, durante a Segunda Guerra Mundial, volta a França com o filho adoptivo, o lama Yongden. Alexandra David-Neel morre em Digne, a 8 de Setembro de 1969, deixando duas dezenas de livros sobre o Tibete, o budismo e cultura oriental.
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(*) «No Rasto de Místicos e Mágicos do Tibete», Alexandra David-Neel, Publicações Europa América, Colecção «Portas do Desconhecido», nº 56■
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